“O Morro dos Ventos Uivantes” é um romance gótico que transcende as convenções de sua época. Publicado em 1847 sob o pseudônimo masculino de Ellis Bell, o livro mergulha nas profundezas das paixões humanas, explorando temas como amor obsessivo, vingança, crueldade e as barreiras sociais. A narrativa é uma teia complexa, contada através de diferentes vozes que nos guiam por duas gerações das famílias Earnshaw e Linton, cujos destinos são irremediavelmente entrelaçados pela figura enigmática e atormentada de Heathcliff. Com a charneca selvagem do norte da Inglaterra como pano de fundo, a obra não é uma simples história de amor, mas uma poderosa e, por vezes, brutal exploração da natureza humana em seu estado mais primitivo e visceral, deixando uma marca indelével em quem a lê.
📑 Resumo por Capítulo
- Capítulos I-III: A história começa em 1801 com Mr. Lockwood, o novo inquilino da Granja dos Tordos, que decide visitar seu senhorio, o recluso e rude Mr. Heathcliff, no Morro dos Ventos Uivantes. A atmosfera da casa é hostil e desoladora. Surpreendido por uma nevasca, Lockwood é forçado a pernoitar e é levado a um quarto antigo, onde encontra os diários de uma jovem chamada Catherine Earnshaw. Durante a noite, ele é assombrado por um pesadelo vívido com o fantasma de Catherine Linton, que implora para entrar. A reação aterrorizada e angustiada de Heathcliff ao ouvir sobre o sonho revela uma ferida profunda e um mistério a ser desvendado.
- Capítulos IV-IX: Intrigado e doente após sua experiência, Lockwood pede à sua governanta, Nelly Dean, que lhe conte a história daquelas estranhas pessoas. Nelly inicia sua narrativa, voltando à infância. Ela conta como o velho Mr. Earnshaw trouxe para casa um menino órfão encontrado em Liverpool, a quem chamou de Heathcliff. Enquanto a filha de Earnshaw, a selvagem Catherine, forma um laço inquebrável com Heathcliff, seu irmão, Hindley, o despreza. Após a morte do patriarca, Hindley se torna o mestre do Morro e rebaixa Heathcliff a servo. Anos depois, um acidente leva Catherine à casa dos refinados Linton na Granja dos Tordos, de onde ela retorna transformada em uma dama. A crescente divisão entre seu amor por Heathcliff e sua atração pela vida sofisticada de Edgar Linton a leva a uma decisão fatídica. Ela aceita se casar com Edgar, afirmando a Nelly que seria uma degradação casar-se com Heathcliff. Heathcliff ouve esta última parte e desaparece por três anos.
- Capítulos X-XVI: Heathcliff retorna, agora um homem rico e polido, para a alegria de Catherine e o desespero de seu marido, Edgar. Ele se instala no Morro dos Ventos Uivantes, explorando o vício de Hindley em jogo para tomar posse da propriedade. A irmã de Edgar, Isabella, apaixona-se por Heathcliff, que a corteja por pura vingança. A tensão entre Edgar e Heathcliff explode, e Catherine, dividida entre os dois, adoece gravemente, caindo em delírio. Enquanto ela definha, Isabella foge com Heathcliff. Meses depois, ocorre um último e devastador encontro entre Catherine e Heathcliff, onde trocam acusações e declarações de um amor que os destruiu. Naquela mesma noite, Catherine morre ao dar à luz sua filha, Cathy. Heathcliff, aniquilado pela dor, roga para que o fantasma de Catherine o assombre para sempre.
- Capítulos XVII-XXI: Isabella foge do tratamento brutal de Heathcliff e vai para Londres, onde dá à luz o filho dele, Linton. Hindley morre, e Heathcliff se torna o mestre absoluto do Morro, tratando o filho de Hindley, Hareton, com a mesma crueldade que sofreu. Doze anos depois, a jovem Cathy, criada em isolamento na Granja, encontra por acaso seu primo Hareton e fica chocada com sua ignorância. Após a morte de Isabella, seu filho Linton, um menino frágil e mimado, vem morar na Granja, mas Heathcliff logo exige a custódia de seu herdeiro. Anos mais tarde, Heathcliff manipula um reencontro entre Cathy e Linton, iniciando uma correspondência secreta entre os primos.
- Capítulos XXII-XXX: Com a saúde de Edgar falhando, Heathcliff intensifica seu plano. Ele força Cathy e Nelly a irem ao Morro e as aprisiona, não permitindo que Cathy saia até que ela se case com o moribundo Linton. Cathy só consegue escapar a tempo de se despedir de seu pai, que morre acreditando que ela está feliz. Com a morte de Edgar e, em seguida, do frágil Linton, Heathcliff se torna o mestre legal da Granja dos Tordos e do Morro dos Ventos Uivantes, completando sua vingança. Cathy é deixada como uma prisioneira viúva, amarga e desdenhosa de seu primo Hareton. É neste ponto que a narrativa de Nelly para Lockwood termina, e ele decide deixar a região.
- Capítulos XXXI-XXXIV: Cerca de um ano depois, Lockwood retorna e visita Nelly, agora no Morro dos Ventos Uivantes. Ele encontra uma cena transformada: Cathy e Hareton, agora apaixonados, estão pacificamente lendo juntos. Nelly narra o desfecho: após a partida de Lockwood, Cathy e Hareton gradualmente se aproximaram e se apaixonaram, formando uma aliança que desafia a tirania de Heathcliff. No entanto, Heathcliff começa a perder o interesse pela vingança, atormentado pela crescente semelhança dos jovens com sua amada Catherine. Ele se torna cada vez mais errático, jejuando e vagando pelas charnecas, até que Nelly o encontra morto em seu quarto, com um sorriso triunfante e assustador no rosto. Ele é enterrado ao lado de sua Catherine. A história termina com a promessa do casamento de Cathy e Hareton e sua mudança para a Granja, deixando o Morro dos Ventos Uivantes para os fantasmas que, segundo a crença local, ainda vagam por lá.
🖋️ Principais Pontos
- Estrutura Narrativa Inovadora: A obra se destaca por sua complexa estrutura de “boneca russa”, com a história principal sendo contada por Nelly Dean a Mr. Lockwood, que por sua vez a relata para nós, leitores. Essa técnica cria uma distância que filtra a paixão crua dos eventos, ao mesmo tempo que levanta questões sobre a confiabilidade dos narradores.
- O Anti-Herói Gótico: Heathcliff é uma das criações mais memoráveis da literatura. Ele não é um herói romântico, mas um anti-herói movido por um amor que se transforma em ódio e uma sede de vingança que o consome. Sua natureza quase demoníaca e sua recusa em ser redimido desafiaram todas as convenções literárias da época.
- A Charneca como Personagem: A paisagem selvagem e desolada do norte da Inglaterra é mais do que um mero cenário. As charnecas (“moors”) refletem a natureza indomável e tempestuosa dos personagens, especialmente de Catherine e Heathcliff. O Morro dos Ventos Uivantes, cujo nome evoca o clima severo, é a personificação física dessa paixão primal e isolamento.
💡 Aprendizados
- A Natureza Cíclica da Vingança e do Abuso: A jornada de Heathcliff é um estudo trágico sobre como o sofrimento pode gerar mais sofrimento. A crueldade que ele sofre na infância é a mesma que ele inflige à geração seguinte. O ciclo só é quebrado pelo amor e pela compaixão que surgem entre Cathy e Hareton, ensinando que a empatia é a única saída.
- Conflito entre Natureza e Cultura: O romance explora a tensão entre a paixão instintiva (natureza), representada por Heathcliff e o Morro, e as convenções sociais (cultura), representadas por Edgar e a Granja. A decisão de Catherine de escolher a segurança social em vez de sua conexão de alma com Heathcliff é o catalisador da tragédia, mostrando as consequências devastadoras de negar a própria essência.
- O Amor como Força Transformadora (para o Bem e para o Mal): “O Morro dos Ventos Uivantes” demonstra que o amor pode ser tanto uma força de criação quanto de destruição. O amor entre Catherine e Heathcliff é tão profundo que transcende a morte, mas sua incapacidade de se concretizar no mundo real o transforma em uma obsessão que aniquila tudo ao redor.
👀 Curiosidades
- Pseudônimo Masculino: Emily Brontë, assim como suas irmãs Charlotte (Currer Bell) e Anne (Acton Bell), publicou sua obra sob um pseudônimo masculino, Ellis Bell, para que seu trabalho fosse levado a sério em uma época em que escritoras não eram vistas com bons olhos.
- Recepção Crítica: Quando foi lançado, o livro chocou os críticos vitorianos, que o consideraram uma obra selvagem, grosseira e imoral por seus temas de crueldade e paixão desenfreada. Sua reputação como um dos maiores romances da língua inglesa cresceu apenas décadas mais tarde.
- A Casa Fictícia: O nome da propriedade, Wuthering Heights, é uma invenção de Brontë, derivado de um termo dialetal de Yorkshire que descreve a exposição a ventos fortes e turbulentos, refletindo perfeitamente a atmosfera da casa e de seus habitantes.
🔄 Conhecimentos Conectados
- Jane Eyre (de Charlotte Brontë): Se você se sentiu atraído pela atmosfera gótica, pelo cenário isolado e pelo herói sombrio e atormentado, o romance da irmã de Emily, Charlotte, é uma escolha perfeita.
- Frankenstein (de Mary Shelley): Compartilha temas de isolamento, rejeição social e a figura do “monstro” ou anti-herói que é moldado pela crueldade que sofre do mundo.
- Rebecca (de Daphne du Maurier): Este suspense gótico moderno ecoa “O Morro dos Ventos Uivantes” em sua atmosfera opressiva, uma grande casa assombrada pelo passado e a presença avassaladora de um amor que transcende a morte.